06 dezembro, 2015

Marília Pera

Eita, que meu coração se acabe em revolta e depressa se refestele com as finalidades da natureza física. Eita, que o corpo não resistindo ao transbordar da vivacidade humana se exploda em pedaços aquietados pela própria energia. Vai-se morrendo devagarinho, sem pressa. Quando não estamos do outro lado de nós mesmos e morremos é como se nossa existência estivesse derrotada, falida. Quando pensamos que somos nós os barões de um interior é ali, no ressentimento de que não somos heróis de nós mesmos, que o fim se inicia. Do nosso outro lado de cá, ficam as cicatrizes, as mágoas, as conquistas, os flashes de lembranças que só são revividos graças à eficiência de uma parte da natureza física.
Seja noite ou tarde, não importa o horário exato, desde que não seja pela manhã, o ócio se aproveita e vai roendo a carne. A pessoa quanto mais experiente é mais o corpo vai resistindo ao crescimento de nossos lados internos. É forte demais a humanidade de alguém que se entrega em arte. É demasiadamente incrível como uma só mergulhada no lago do teatro e do canto nos faz condenados a uma vida imensamente bela.
É na manhã que partimos para o sagrado, o pueril, o eterno silêncio e também árduo embruscamento. É pela manhã que todo início parece não ter término, que toda imensidão pode ser revelada e que todo ar nos revigora.
Há mais certezas na manhã que a tarde, mesmo preguiçosa, e a noite, a mais lasciva das forças, podem alcançar.

21 outubro, 2015

Quando eu morrer

Quando eu morrer qual será o último filme assistido por mim?
O desgosto não arrependido que me amargará a garganta?
O sonho não realizado confortavelmente?
A música ouvida e gravada no histórico?
A página do livro lido incompletamente?
A deliciosa refeição sem sobras e o sabor do suco que degustarei?

Quando eu morrer
Qual será o gesto incompreendido que afetei outrem sem intenções grosseiras? E as provocações?
As palavras mais doces que proferirei?
O encanto escondido e não declarado a um confidente?
A mensagem sem resposta no aplicativo do celular?
O lençol ainda desarrumado na cama que descasei sozinho?
A cor do sabonete ainda no chão no banheiro?
O meu perfume preferido não esborrifado?
A minha paquera conquistada e ainda em flertes comigo? Os minutos de espera até saber que nunca mais irei escrever a ela.
A contagem correta e precisa dos anos, meses, semanas, dias, horas, minutos e segundos vividos e compartilhados?

No exato momento de minha morte
Qual será o nome da pessoa que ouvirá o último bater de meu coração?
O primeiro de meus amados parentes e sua reação?
Os últimos lábios encontrados inebriadamente junto aos meus?
A minha sagaz cantada dada ao meu amor?
A derradeira curtida em uma foto?
O primeiro comentário virtual de pêsames?

A minha mais bela imagem que lembrarei de você?

17 setembro, 2015

O que eu vi em você

Percebi a primeira olhada que sua boca merecia um beijo. Um beijo que seria demorado, um pouco sem fôlego. É como eu tenho beijado ultimamente: sem fôlego. Enxerguei atentamente que seus lábios, porém, não estão preparados nem para um beijo, quanto mais para um beijo sem fôlego.
Olhei mais agudamente e ainda não tive aquele frio quando pensei em doar um beijo a alguém. Um boca que parece doar um beijo seco, assim você se mostrou.
Imagine! Um beijo árido em contato com outro sem fôlego. O que eu vi em você foi apenas a promessa de que um dia, novamente, encontraremos nossos lábios doados a seus reais benfeitores.

31 agosto, 2015

Daquele seu jeitinho

Era domingo. Mais um domingo qualquer e eu percebi o quanto você me faz falta. Nada contra o meu presente, mas você me faz muita falta. Na verdade, muita coisa me faz falta hoje. Na mais pura verdade, falta a todos nós tanta coisa que prefiro cometer erros pela própria falta de palavras que pelo excesso.
Sem desmerecer o meu presente, mas o seu toque me faz muita falta. Era ele que me deixava nas alturas do conforto emocional. Adorava a sensação de balançar meu cabelos por entre seus dedos. Sem pestanejar, lá eu estava no nosso mundo de ingênuas decisões, com os corações quietinhos e as mãos mornas do afago. Você me ouvia falar atentamente. Quase não me interrompia. Era eu o seu rei e você era todo o meu império. 
Por mais que eu não queira desdenhar o meu presente, o seu cheiro me faz imensa falta. Ele emanava um aroma de serenidade para as confusões mentais tão indignas que me submetiam as alheias almas que eu insistia em chamar de companheiras.
Jamais negaria o meu presente, mas a nossa história construída junta me faz insuportável falta. Eram os meus planos de vida que eu falava e você, como a alma mais atenta que já encontrei, acalentava minha angústia e dúvidas sobre o futuro com apenas uma entrega de olhar.
Você me faz falta porque temos um passado que eu tentei manter, no presente, mais duradouro possível. Você me faz ainda muita falta porque não é apenas mais uma memória que tento cobrar a mais pura nitidez do passado. É sim o passado que sempre nos procura e bate em nossa porta. Ah sim! Ele sempre baterá à porta, ali no futuro.

20 agosto, 2015

Fosso

Por maior que seja a falta
Nós nunca seríamos
Fomos
Aprendi que o ímpar é mais seguro que as derivações geométricas
Quem morno fica por muitos anos no espaço?
Qual gosto tem a boca que por vezes já foi mastigada?
Que aroma de pele não se torna gravado em mente insensata?
Qual rotina não os levará à própria sorte?

Por maior que seja a minha infelicidade
Nós nunca fomos pares
Fosso
Ensinei a mim mesmo que a insegurança é mais atenta que a liberdade
Por conta minha e por minha desaventura
Quem ousa dirigir novamente a palavra para o outro, tão distante já?
Que tipo de desassossego perene eleva a rispidez de toques frívolos e medianos?
Em qual ângulo o perfil de um se torna menos simétrico e indisposto ao outro?

Por maior que esteja minha sagaz procura por outro colo
soube que nós nunca teríamos nos dado dedicadamente por muitos meses o mesmo prazer
Somos
Desaprendi a arte da argumentação, pois era por ela que me embrenhava em matas desinteressantes
Quem diria que eu esqueceria a temperatura que emanava de suas mãos acariciando meus cabelos, hoje compridos?
Que maternidade desdenharia nossa concepção, a qual somente uma mãe notou minha tamanha devoção ao seu corpo e mente?

Por menor que esteja meu instinto
Por menos ar que a minha vontade de prazer epicurista inale
Já nos condenaram os estóicos
Somos da matéria e não vamos nos felicitar nunca mais

03 agosto, 2015

21.07.15

Eu não devo deixar nunca de agradecer ao tempo. Eu não devo esquecer nunca o que o tempo é capaz de construir. Já nos bastamos de limites, ainda mais os impostos pelo senhor de todos. Mas precisamos nos fartar de tudo aquilo que ele nos oferece, como se estívessemos em um banquete por toda a vida. Ele oferece um sorriso como aquele que você possui. Quanta fartura! A simpatia e alegria de conversar como aquelas encontradas em você a cada caminhada no parque. E, claro, a mais bela e frutuosa alma como aquela que habita dentro de você. De todos os desejos realizáveis, eu espero que o tempo faça o mais justo dos exercícios: o mantenha duradouramente vivo. Vida longa meu pequeno príncipe.

30 julho, 2015

O que é, é.

É, hoje a noite é para se amar. Amar de todo jeito. Várias intensidades. É, hoje a noite é para nos termos em abraços e beijos incansáveis. Demonstrarmos um ao outro quem é que manda em nossos corações: nenhum de nós, individualmente. Pensar como um nó e não dois alinhados.
É, hoje a noite é para recordar o breve histórico de nosso convívio que não inspirou mais planos futuros. Seria hoje que consagraríamos, junto à luz da lua que lá fora brilha, todo o ardor de cada lado esquerdo de nosso peito, entre mordidas no pescoço, declarações perfumadas de interesse e chamego enlouquecedor dado na nuca, puxando os fios do cabelo.
É, hoje a noite promete ficar mais incandescente que os dias mais ensolarados do verão. Hoje, eu sei, que está disposto a enterrar, definitivamente, o mais puro toque que já ofertou a alguém, em troca de uma segurança que você não tem e jamais construirá. É, hoje a noite vai ambientar palavras doadas pela sua boca, tão singelas, mas efêmeras. Hoje, a noite testemunhará o início de seu infortúnio. É o que desejo, profundamente.

20 julho, 2015

Resposta ao ódio

Fazia um bom período de tempo que não conversava mais sobre os desafios atuais do mundo. Perdeu o fino trato, isso já era mais que notável. Perdeu-se também em pensamentos quando em rodas de conversas inúteis. Quem era naquele momento em que a leitura já não o poderia salvar mais? Quem deixou de ser, intolerantemente? Alguém demasiadamente interessante para os amores contemporâneos. Ficou calado muitas vezes. Ouviu desaforos, grandiosamente insensíveis. Reclamou certa vez, como se desejasse dar um basta às incompreensões: “você consegue ser profundamente violento comigo.” É ódio que por mim sente, hoje. Então é amor, desde o passado, que irá receber de mim.

01 junho, 2015

É

Não é a falta de seu corpo que lamento.
Reivindicaria a quem?
É dos sorrisos, comuns a nós, que foram extraviados em noites quaisquer.

Não é a falta do som de suas palavras que suplico.
Ouviriam murmúrios meus? Quem?
É da conexão inegável existente entre nossos olhares.

Não é a falta dos seus comentários sobre o perfume de minha roupa.
Todas as águas do mundo poderiam lavá-la?
É do cuidado que tem quando repara em mim.

Não é a falta de um suporte que seu braço trazia a minha mão e seu ombro a minha testa.
Qual cama lhe aqueceria melhor após diversão noturna?
É do afeto que nós teimamos em negar um ao outro em silêncio.

Não é a falta de seus queixumes sobre mim e sua vida modesta.
Qual comprimido mágico recuperaria tal braveza?
É do que dividíamos para acalentar nossas almas.

Não é a falta de seus lábios permitindo que eu os mordesse.
Houve saída para o meu humor?
É do sarcasmo que nos envolvia inebriadamente durante a madrugada.

Nunca senti a falta de nossos encontros semanais, propositais.
Que deus retrocederia o grande relógio universal?
É da memória que se apagará com o futuro, por fim.

20 maio, 2015

Feliz aniversário

Ah! Pelo assopro de uma vontade existirão reconhecimentos. Expressou-se, era a única maneira de salvaguardar sua própria vida.

“Não tenho poesia para explicar poucas maravilhas em minha vida. São ímpares. Uma das mais intensas naturezas és tu. Aquele que se faz humano a cada dia. Não possuo expressão para vivenciar cada instante ao teu lado. Tu és meu, já. Tu és a mais singular alegria que uma certa divindade, ou até mesmo o destino, me ofereceu. Em todos os momentos que olho para ti enxergo a paz. Paz que em muitos dias me falta e assim me sufoco. Ao teu lado me torno gente, gente de verdade e, por essa razão, continuo a viver. Se os deuses existem, devem ter me condenado a poucos sorrisos intensos e um deles és tu. Amo-te. Amo-te como minha própria carne. Desejo que os deuses me levem se eu não mais for para ti necessário. Amo. Amo demasiadamente. Obrigado.”


E completou-se um ciclo e o início de outro, a quem pertença, logo, logo se manifestará.

13 abril, 2015

Um dia em uma loja de departamentos

Hoje, de modo quase impressionante, tive um diálogo rápido, porém frutuoso com o caixa da loja de departamentos.

Ouvi do moço: "Boa noite senhor, tudo bem"? Respondi com leve sarcasmo: "Bem para quem pode." E ele: "Verdade, né?". Continuou: "Eu não sei onde eu vi, não lembro, mas era algo coisa que falava que se o brasileiro fala que está bem ele na verdade não está!" Eu considerei: "Verdade!". Ele executando a função e colocando meus futuros bens nas sacolas: "São 26,70!" Eu interpelei com ar irônico: "Tudo isso!?" "Débito!" Ele, começando a rir: "Pode inserir o cartão!". Depois continuou, digitando repetidamente as mesmas teclas: "Esse computador é lento demais!" E eu, interessando-me pelo desfecho e já ter digitado a senha e retirando o cartão da máquina: "Obrigado!" Ele, rindo: "Não quer levar essa torradeira? Eu tenho lá em casa!" Antes mesmo que eu reprimisse a tentativa, e ele ainda rindo: "Tô brincando, tenho não!" Eu, por fim: "Valeu!" E ele gentilmente: "Obrigado senhor e boa noite! Próximo!"

Tudo muda

Eu não sou um mestre, mas sei que tudo muda. Às vezes quero acreditar ao contrário, mas além do fim tenho a certeza de que tudo nessa existência se altera, querendo ou não. As premissas estão em todos os mais desprezíveis sinais, os aparentemente insignificantes: no abraço dado, no aperto de mãos envergonhadas, no fitar dos olhos e no não esquecimento do colo seguro.

24 março, 2015

Você esteve ai o tempo todo

Nós sabemos o que deveríamos ter feito. Já não temos mais idade nem tempo para joguetes e imaturas decisões. Somos donos de nós mesmos. Foi por essa razão que não nos comprometemos? Talvez. Diga sempre que não me quis, pois saiba que intimidade é cara em dias atuais e eu continuarei a rir dessa desfeita falsa. Estava em nossos rostos o desejo.
Deixe de me elogiar, nunca foi um exercício muito gratuito a você mesmo. E nunca será. Eu compreendo. Permita que eu o alcance, todavia. Facilite a oportunidade e esqueçamos das incapacidades individuais passadas. Éramos tão senhores quando um no colo do outro confessávamos impressões subalternas. Você tentou. Eu aceitei.
Permaneça, mesmo distante, nessa postura sem filosofia e eu em minhas dúvidas perpétuas. Recrie a iniciativa, pois nosso desejo é comum e incomensurável. Eterno. Eu ainda me recordo a cada dia de seu olhar em espanto. Depois de uma boa refeição olhe para frente de seu pleito e reivindique atenção outrora unicamente por mim oferecida. Sorriso frouxo e inquietudes satisfeitas eram constantes, você sabe muito bem disso. Para de se declarar, mesmo em olhares eu percebo que já não é mais dono de si mesmo como antes. Largue o figurino de amador e torne-se protagonista dessa história. Impeça a inconstância de um devir que sabe melhor do que ninguém que sou eu quem lhe completa, sustenta e preenche. Incite mais palavras e menos silêncio, a não ser que este seja para nos reconectarmos.

Fuja o quanto pretender. Negue o máximo que resultar de seu desconforto ao me ver. Só não se esqueça de mim completamente, pois não conseguirá. Por mais árduo esforço que exercite. Por maior que seja a angústia. Pela certeza de um finito sem alguém ao seu lado. Sou eu, somente eu a parcela mais dócil que lhe conquistou. Descobri em meio a sua casa o quanto você me queria bem e por perto. Negue o seu afeto por mim, várias vezes comedido, mas sufocante ai dentro do peito. Reclame que também já não se lembra mais de meus lábios. Esnobe minhas lágrimas como o sempre fez. E sobretudo o que vivemos, recordará que foi por mim que seus motivos pelo encanto em formato de sorriso se refizeram em verdades memoráveis. Durma bem. Durmamos para o nosso contínuo sublime.

16 fevereiro, 2015

Ceia

Sofro de um mal. O mais temido por todos esclarecidos. Sou movido pelas emoções e somente elas se fazem fonte do meu escrito. Foram meses tentando segurar pelas mãos a saudade. Ela já se caduca em nosso tempo, mesmo assim é persistente. Desgasta-se dando espaço a segunda menos frágil, a contemplação do corpo alheio. Deveria ter com ela em bons esculachos! Não, neguei a mim o esforço de enforcá-la. Depois, com cantos excitantes, vem a esperança, a mais carrancuda de todas. Bela, porém mesquinha, quer se desfazer de todas as outras para ser admirada pelos humanos. Sem competidoras se refestela no salão nobre dos engodos. É nossa imperatriz, salvaguardada pelas justificativas dos leigos. E lá, mais intimidado, quieto e desajeitado está quem realmente embala meus dizeres: o... Sua beleza é ainda maior que todas do salão. Não aparece facilmente nos bailes para não atrair, mesmo sem desejar propositalmente, a atenção de todas e todos. Jamais resmunga. Serve-se dos servos que estão a renovar os alimentos e as bebidas das mesas mais assediadas. Mesmo vestido modestamente se torna o único no quadrante que provoca aquele silêncio quase enlouquecedor. Gestos seguros e pompas em todas as falas causam alvoroço nas ingênuas almas. Ficam perplexas. De sorriso invejavelmente esplêndido, esconde no mais delicado e sublime gesto labial a coragem de saber que é dono daquele império. Raramente apareceu, e para mim nunca, mas sei de sua presença ao redor, me observando. Quando dou por mim, já tomado pela curiosidade, que estrategicamente quer me pregar uma peça, estou olhando atrás das cortinas a procurá-lo. Sinto seu olhar e tenho receio de ser menos saboroso como os outros.

Hoje, por fim, não consigo mais suplicar que as tenha, que as guarde ou até mesmo alimentá-las com memórias somente a mim fundamentais. Crescer é propor uma história de vida que antes do finito se possa contemplar os êxitos, em versos expressos. Sei, de fato, que em breve me motivarei a cear com as emoções em fartos banquetes noturnos, servidos entre naturezas mortas, enquadradas nas paredes do meu desespero.

12 janeiro, 2015

Às vezes


“Tenho medo!”, gritei do interior do meu ser.
Medo não é um sentimento agradável, mas quem consegue ludibriá-lo? Eu sei! Nem mesmo os mais sábios conseguiram. Engano! Equivoquei-me. Há sim uma maneira de contornar o medo: fazendo dele cúmplice do sofrimento. Sim, olhe cá! Eu explico!
Por um lado o medo impõe as mãos contra o peito do dito cujo e o faz desistir. Isso acontece com os imaturos e assustados. O mundo gira mesmo, não é? Então, quando acontece, o tal nível de enfrentamento fica lá em baixo. Bem baixinho. Pequenininho. Quase um desalmado ser. Por sua vez, é quando os sábios emparelham medo e sofrimento formando um corpo, pois o medo é um espectro. Paira sem substância dentro de nós. Com corpo o medo inflama o sofrimento. É sua força motriz. Este fica mais pontiagudo. Rígido. Largo e sem limites. Como a alma que dizem habitar nosso corpo. Mais ou menos assim, sabe!?
Então, quando começam os sintomas em alguém que se contaminou com o próprio medo, o sofrimento se torna tão áspero e austero causando dores estomacais, risos frouxos e mãos inquietas. Deixa-se de compartilhar experiências agradáveis, desfaz-se de detalhes e teatraliza inquietudes. E no momento em que o ser se prostra frente ao medo-sofrimento daí surge a evolução do corpo: o terror.
Ah o terror! Exalta os horizontes da preocupação. Ignora a sensatez. Despedaça a paciência. Contra o medo-sofrimento em seu estágio embrionário podemos construir medidas eficazes e mais urgentes. Já com o terror alimentado! Só podemos aguardar. Aguardamos o instante mais prudente para enxergarmos o corpo-sofrimento-medo e nos aproximarmos do corpo-desejo-segurança para contrapô-los. O duelo se inicia. As horas, dias, semanas passam velozmente. Esquecemo-nos dos compromissos mais pessoais. Retornamos às ideias fixas. Suplicamos desenxabidamente por colo e a solidão se refestela.
Distanciamos pessoas que eram nossas. Não detemos mais a simpatia. Faz-se falta o colo. Os risos desaparecem na memória. A pele envelhece ausente o toque e os detalhes são esquecidos. Assim, para aqueles que não apreciam os detalhes e os menosprezam não lhes cabe um banquete. Há fome. E sem saciedade o ser não produz. Desconstrói sentidos. Emburrica. O perfume alheio já não provoca mais sorrisos gratuitos durante uma jornada de trabalho. É inflamado o orgulho. E o fim se encerra com a ironia. Sim, tenho medo! Só não posso mais afrouxar as correntes do corpo-medo-sofrimento para que alcance seu alimento mais apetitoso: a nossa vaidade.