15 junho, 2020

Solitude

Há anos reparo nas pessoas que me beijam. Foram beijos desimportantes na sua maioria. Na verdade, eu nunca estive muito preparado para beijar alguém em diferentes circunstâncias. De fato, eu sempre mantive uma esperança em ser envolvido por um toque singular, original e indefeso. Isso não aconteceu até lhe encontrar.
Como sempre os meus começos acontecem erroneamente. Você nem havia me reparado antes. Eu era apenas um conhecido. Nada muito diverso do que são acometidos outros casais. Casais? Que pretensão a minha, não?
Mas todos, todos exceto você, vieram acompanhados. Havia neles espírito, enganos, vontades, intenções, desejos sexuais, volúpia, falsos discursos, encantamentos etc. Exceto você! Você nem queria ter vindo. Você não é de ir, mas sim de ser conduzido. Ocorreu algo entre nós que já se esvaiu, mas não totalmente, ao menos é o que está acontecendo.
Creiamos que tudo esteja bem, em vista da sua imprudência do passado. Porém, ainda está ali, sozinho, vazio, como se estivesse intacto pelas suas más escolhas. Pulsa em você vontades. Quais exatamente?
É isso! O que exatamente lhe motiva em chamar o meu nome? Nada generalizado, pois poderia ser quaisquer outros nomes. Algo que esteja relacionado a mim, intensamente? Creio que não. Enfim, poderíamos ter continuado a ser íntimos? Provavelmente não, também. Talvez encantados? Não, jamais. E agora? O que temos?
Você não me tem. Possivelmente não me terá outra vez. Eu tive a sua ausência desde o primeiro, e interessado, beijo.

11 maio, 2020

Permissão

Eu perdi aos poucos o controle da minha vida.
Aquele que dizia ser íntimo não condizia com as verdades.
Pouco a pouco se confundiria entre afetos
de se manter toda apreciado.

Eu prometi há poucos dias
que a minha sorte era para o outro lado.
Quem ao menos me percebia
intentava me provocar com desajeitada maestria.

Logo, eu que pertenço a uma incontrolável ironia
desenrolava um fino trato
perguntavam-se o que sentia
entretanto, o peito já maculado.

Ao me ver tão distante
Aquele que se promovia
Descontinuava sua simpatia
Voltando-se contra a minha incompatibilidade.

Já desgastados de um leva e traz de pretensões sem fim
Enxugariam seus intentos ao pé da cama mal arrumado
traziam nenhuma recordação e qualquer fantasia
Mesmo, por fim, ainda inebriados.

10 maio, 2020

O amor nunca vence

Hoje, por respeito próprio, deverei tratá-lo como se fosse desconhecido. Eu tinha tanta coisa para você. Coisas verdadeiramente bonitas, incríveis, minhas e eram todas para serem doadas por motivos da paixão. Beijo demorado é uma delas. Parece fantasioso acreditar nesse encontro de lábios saudosos, mas nunca foi, ao menos, e somente, para mim.
Quando nos conhecemos, saiba que eu não o desejei. Talvez eu nunca tivesse pensado em lhe tocar. Motivado por terceiros, acabei deixando você tentar uma verdadeira aproximação. Verdade, sabe? Não, você se afastou tão distantemente da verdade que agora se tornou um estranho entre os que o querem bem.
A paixão aos poucos foi dando espaço para a cautela. Violência! Pensei em enfrentá-lo, mas deixei que pudesse demonstrar empatia. Não houve e tenho claro que não tem a mínima habilidade da empatia. Seus olhos... naquela noite... seus olhos me assustaram e me questionei: como pode tão jovem corpo sofrer da incapacidade de amar? Qual o tamanho da dor que o transformou inabitado? Sem alma!
Voz vazia, pele sem textura, abraço sem força, mãos ocas, cabelo sufocado pelo chapéu, olhos vendados pelos óculos escuros: poderia, se houvesse refinamento, ser um personagem de histórias de suspense, mas que de fato não passava de um trailer trash. Péssima produção. Verdadeiramente egoísta. Olhos ocos. Monstro!
Exitei, confesso. Envolvi-o, com engasgos na garganta, de palavras doces para meus companheiros. Fingi, declaro. Orquestrei uma aproximação. Engoli o seu orgulho e o modo como me rejeitou na frente de outros. Desumano! Já não me afetava mais.
Provoquei um cenário de paixão sólida. Não se empolgue, era apenas uma atuação.
Hoje você deu a sua própria conta. Criou prova contra si. Amarrou-se de vez no abismo da insensatez. Que a sorte livre os bons de seu caminho.
Se tivesse me solicitado, falta em razão da sua limitação cognitiva, eu o teria conduzido, mesmo que de má-fé por sua escolha, em um modo mais criativo de se vingar de quem não tem a culpa de você ser em nada especial. Você se faz vítima de uma vida que, de fato, não tem sentido algum. Ademais, eu não quis acreditar que pudesse ser uma verdade: seus olhos estavam vazios e continuava a conduzir o próprio corpo para a ruína. 
Desejaria a você a sorte de poder um dia, preencher seus olhos com desejos mais verdadeiros que seus beijos e totalmente mais reais que suas palavras. Quando me atenho minha visão para a última imagem sua vejo você debruçado em cima de uma mesa escolar, adormecido, com postura patética de um jovem que já desfalecido espera vingar-se da humanidade por sua única incapacidade de se fazer feliz e a fazer outros encantados, numa enfadonha cena ridícula de conquistas medíocres, de posturas abjetas e singularidades nada originais. Despeço-me, sem olhar para sua direção.

02 março, 2020

O nome delas

Por muito tempo, na verdade por todo o período que compreendo pela razão sobre a minha existência, eu me incomodo com meu sobrenome. Não necessariamente, apenas, contra o sobrenome, mas com o ritmo que ele dá e a sonoridade incabível em conjunto com o meu nome.
A história já se inicia nefasta e desafortunada porquê não fui eu quem o ritmou - penso mais que seja por uma questão de sonoridade que de ritmo, mas manterei aquele primeiro - e tão menos poderei alterá-lo: é que a lei dos homens excepcionam a mudança e a minha situação não se faz regra.
Verdadeiramente, o primeiro incômodo foi ser retirado do útero e ter sido depositado em um berço sem realeza (o que antes na adolescência incomodava mais). Por vezes, reclamei, apenas para mim, sobre a questão. Minto! Havia comentado com um ou dois sérios colegas de convívio, nada muito profundamente.
O segundo ponto é que minha mãe deu a minha tia, irmã de meu pai, a oportunidade de escolher o feito, e assim o fez: contam que era por causa de um mentor espiritual ou que poderia ser em razão de um personagem novelístico na época de meu nascimento - um gajo muito garboso, comentaram. 
O fundamental ponto, contudo, é que o nome completo não se alinha! Demônio!
Ele se faz, quando chamado por inteiro, harmônico, mas, infortunadamente, quando separado parece uma tirania de gritos e resmungos. Para completar a inquietude, ainda possui em dupla de títulos: são dois nomes e dois sobrenomes. Apesar de não ser uma chamada original, não é penetrante aos ouvidos mais sensíveis a ponto de perturbá-los: "é só um modo de falar", haviam me alertado. Ninguém comenta em uma trivial conversa o título completo de uma pessoa física! Sempre aos pedaços ou por cognome. Ali outra perturbação: nunca se referiram a mim e muito menos por minha permissão por apelidos, o que demonstra a minha aptidão em ser nomeado pelo que foi registrado em cartório mesmo.
É um sentimento de não pertencimento, não sabe?
Anos preocupado em como eu poderia me apresentar, surgiram opções. Todas derivadas e comentadas, criticamente, dentro de minha mente, com suas respectivas emoções. Lá vão!
Opção primeira: usar os dois nomes e o seguinte sobrenome. Fica grande e sem sonoridade. Deprimente. É como se a pessoa corresse e quando estivesse com a máxima velocidade o espaço se acabasse. Ponto.
Opção segunda: usar os dois nomes e o último sobrenome. Incompleto, mas forte. Mesmo assim não me parece adequado para uma apresentação formal, sabe? Um nome de autoria de obras clássicas. Não que meu nome seja de representação antiga, apesar de sua origem ser deveras arcaico. Mas o som, entende? Traz um humor de antiguidade e minha aparência ainda reluz jovialidade.
Opção terceira: o primeiro nome 

Aprender a beijar

De todos os aprendizados que me ofertaram o mais incrível que não consegui, ainda, apreender foi beijar. Beijar... Beijo já começa com a segunda letra do alfabeto. Nada demais até ai. Com o tempo, e com a perda do envergonhamento juvenil, começamos a beijar bochechas com mais ênfase. Concordo com os críticos de que beijo desavergonhado é melhor, contudo, não me satisfaz. A envergonhação intimida até os mais bravos.
Certa vez percebi, conversando comigo mesmo, que beijo desajeitadamente. Até ai nada demais, também. Aprendi a coordenação motora, sei caminhar sem tonteadas. Consigo ficar por poucos minutos com uma perna só. Sei olhar com atenção e presteza as características de quem (ou do que) me afeta. Sei até “pisar em ovos”, como dizem os mais humorados, mas, infortunadamente, não aprendi a beijar.
Ouvi muitos clamores dos inebriados por aventuras românticas de que o beijo, só por seu ato de realização, elevaria as sensações e se bastaria. Bastaria...
A quem se basta? Ao patético desafortunado que mal consegue chupar umas laranjas? Ao ridículo que deseja os lábios de alguém que não lhe deposita ao menos uma piscadela? Ao esdrúxulo casal, em banco carcomido da praça, envolvendo-se em prisões desnecessárias a um espetáculo grotesco em frente à população invejosa? Ou a você que nunca permitiu ser beijado (a) com afinco?