21 julho, 2017

Quando

Quando você se apaixonar o mundo vai se tornar diferente, na verdade as pessoas se apresentam diferentes. No fundo, no fundo, nada mudou. Nem mudará. O vento continuará a soprar em cantos que antes você não percebia. O vento... o ar é o elemento essencial para seus pulmões, mas quando você se apaixonar, nem irá notar os arrepios que ele provocará.

Quando você se apaixonar a tela do cinema passa a ser o aconchego ao lado de quem se admira. Realmente, nada se transformou. O ator continuará a ser o protagonista ilustre, enquanto o vilão está a assombrar as mentes inquietas dos cinéfilos. O filme... a cena é um recorte de uma história essencial para nossa distração e entretenimento, mas quando você se apaixonar, não perceberá que as mãos já estavam juntas, desde o começo.

Quando você se apaixonar os trabalhos acadêmicos não serão um imenso entrave, enquanto você tenta focar sua atenção nas leituras e escrita. De fato, as coisas permanecem como estão: em cima da estante de livros e anotações espalhadas. As anotações são pedaços de um lembrete que não se pode esquecer. As anotações... as palavras são fundamentais para a coerência do texto, mas quando você se apaixonar, de repente notará que o sorriso já se fazia em seu rosto.

29 maio, 2017

Hoje eu sonhei com você de novo

Ontem eu estive chateado. Chateado com o mundo e com seus habitantes, os mais próximos a mim ao menos. Nada dramático, apenas chateações que surgem no decorrer do dia. Eu sei a fonte principal do descontentamento que me perfura e, como sempre pretendo, evito expor o ser insuportável que habita em mim.
Quando me deitei, tentei escapar da vis intenções que percorreram a mente. Eram coices e desequilíbrios emocionais e em nenhum deles vocês esteve. Era final de dia. Passei, contudo, meses tentando sentir raiva da sua ausência. Confesso que não é comum eu conviver com amáveis sentimentos sobre as pessoas, mas nessa situação parece ter me preenchido imensamente de amor, desde quando caminhávamos juntos à noite no Parque.
A maioria das pessoas não entenderam esse convívio. Talvez, nem mesmo nós dois entendíamos. Pois foi assim que nos distanciamos: casuisticamente.
Tenho a impressão, contudo, de ter deixado você me amar muito além do permitido. Como se fossemos um casal encantado. Perderíamos nossa independência, afinal nos conhecíamos muito bem, ou, como se queira hoje, diplomático, conhecíamo-nos o suficiente para não arriscarmos um devaneio emocional.
Quando percebi que estava sonolento o suficiente para cerrar os olhos, veio a mim a sensação de incompletude, abstenção e vazio. É ruim esse sentimento, mas como estamos em tempos de absurdos, desfiz-me dessa empatia por ele. É degradante a um homem quando se apercebe que está com saudades de alguém que amou e esse alguém ainda vive. Está no limite do ridículo, pois o pensamento não arreda e continua circulando imagens passadas.
O sono foi se apossando de mim e como sempre me inquietei. Passado um tempo que não percebi, já estava em sua frente. Seu rosto devidamente delineado demonstrava sisudez e antipatia. Também pudera, já não estávamos mais abençoados pela graça da intimidade. Questionei se estaria com saudades de mim. Deu um sorriso acanhado e desenxabido. Eu entendi e por dentro algo agudo perfurante rompeu, rapidamente, a borda de esperança que resistia. O tempo é o pior inimigo dos humanos, mesmo os mais fraternais. Não resmunguei, por certo, em sua frente. Tentei remediar o abismo ali posto por você com outra pergunta, mas me esqueci qual era. Você se virou, andou alguns passos incontáveis e soltou que estava de partida. Eu, querendo insistir, e mesmo desmotivado, deixei-o quieto e com o seu andar nos distanciamos. Você desapareceu para aquele sempre.
Acordei, pouco menos emburrado que a noite anterior. Tomei-me pelas águas em banho e deitei-me novamente entre o lençol remexido e os travesseiros. Esqueci de desligar o abajur e, ainda sonolento, voltei a procurar sua imagem em sonho.

03 abril, 2017

Alcance

Desculpe-me, eu passei o dia inteiro evitando pensar e ver suas postagens na rede. Passei horas entre o cansaço de um final de semana intensamente juvenil e as primeiras horas da futura semana em um domingo sem esperança. Já devo ter reclamado ao menos todos os domingos sobre o ar que paira durante esse que é o mais desastroso dos dias. Preciso descansar... Descansar do que? Um dia de folga para quem, para o coração, para a mente, para a vontade de repetir o beijo? Folgado é o domingo, pois bem ele foi criado para isso! Que os diabos me lambam!
Eu sei, eu sei... o que aconteceu já é passado. Eu sei e nunca me privei de experimentar novas relações, mas... não tem porque me envergonhar, não é mesmo? Eu consigo pensar que foi bom para você, enquanto para mim, além de surpreendente, foi muito bom. Eu diria ótimo. Eu sei que haverá garbosos pensamentos sobre o seu desempenho, envolto em um olhar despretensioso, demonstrando agradecimento, mas é que o mais importante agora seria a minha sinceridade. Também não estou me empobrecendo... O ponto não sou eu, necessariamente...
Por que eu escrevo isso? Porque quem já está endurecido de solidão dificilmente se sente íntimo do afeto alheio. É claro que o meu pessimismo amoroso não me levará a nada, mas se ao nada estou imerso e o pensamento positivo não resolveu até hoje, o que me impediria de me esbaldar no pessimismo?
Eu cheguei em casa o mais rápido possível. Ninguém me esperava. Eu acabei me banhando novamente. Esqueci de fechar a porta e acabei nu em frente ao espelho. Por ter saído do contato com o seu corpo e ao enxergar o meu reflexo foi como se eu houvesse me visto pela primeira vez e tomei-me, por hora, de um outro pensamento: a feiura.
Com o passar da idade e das capacidades, as pessoas parecem se certificar de que melhoraram em todos os aspectos: falácia. Elas aprendem, assim como eu tentei lhe ensinar, que o tempo amplia nossas percepções: idiotia! Nem eu acredito nisso. O tempo, por ser o mais poderoso dos deuses, só destrói. Eu e minha pretensão de ser grande num futuro em que o fim é certo, determinado e imponente já me faz pensar em quão ridículo me tornei. O mesmo fim que parece estar a minha certeza sobre meu alcance é o fim que eu mesmo me encontro, ao menos em um dos períodos da jornada diária, todos os dias.
Lá vou eu, novamente, na seara da improdutividade emocional. E não faça essa cara de compreensão e entendimento. Onde estão as suas reações emocionais? A fonte da minha angústia está nas grandes pretensões que eu lancei para que as alcançasse sem muito esperar. E o que eu alcance? Beijos e afetos menos responsáveis. Celibato compulsório por me arriscar em aventuras imorais. Dúvidas sobre o meu real desejo, enquanto me definho dentro do meu quarto, que você nunca visitará.
O mais interessante é que sua beleza não deve se fixar em minha vontade, somente em minha memória. Seu encanto deverá ser de outro e não meu, afinal não ensino a beijar e nem a surpreender as pessoas. É como se você soubesse que eu iria ao seu encontro e eu, magicamente encantado, me permiti reviver essa experiência: a do beijo alheio ofertado a mim, sem minha iniciativa.
Antes que você se vá, saiba que o nosso tempo de intimidade foi, profundamente, satisfatório e doce para mim. Inexistem explicações a partir de agora, concordo...

Quando repousar, desejo que durma tão bem, como se pudesse caminhar sobre a maciez das nuvens e acordar em volto de caridade.

14 janeiro, 2017

Por que?

Sempre duvide de mim. Duvide do quanto eu possa lhe dar. Possa pretender oferecer. O que eu ofereço é artificial, momentâneo e despretensioso. Sempre desconfie do meu sorriso. Ele é rígido e seguro, mas indevido: é apenas cenográfico. Desconstrua as certezas sobre mim e muito menos acredite que esteja havendo um "nós".
Retire de sua memória as palavras dóceis que lhe ofertei quando nos apresentamos. Oferta de menos é o maior lucro conquistado. Quando toquei seu braço foi por descuido e não para insinuar desejo, porque eu não o sinto ainda. Não fico imaginando estar ao seu lado quando acordar e convidar para o cinema num sábado à noite. Minhas intenções são nulas. Eu estou nulo. Talvez eu o seja para sempre. Já não consigo mais pertencer à alma alguma. Elas são sem nutrientes para mim. Você é sem nutriente para mim. Não tem fibra, força. Jamais me estimularia. Absolutamente, desnutrição.
Por todos os santos e santas, destrua esse sentimento que ousou possuir, pretensiosamente. Você não tem sustentáculos emocionais para me pedir que fique. Seu lado é o menor espaço que eu poderia residir. Ele é claustrofóbico, deprimente, inseguro, imaturo, desenxabido, desagradável, desinteressante, impróprio, envergado, dissimulado, vil, torto, impuro, infiel, inacabado, úmido e, fundamentalmente, não meu.
Sempre duvide de mim. Procure manter distância. Seu odor altera meu humor. Fico irritado com a possibilidade de poder encostar meu nariz na sua bochecha ao cumprimento polido e exponencialmente desnecessário. Envolver minha mão por volta de sua cintura e sussurrar ao seu ouvido? Por favor! Precisaria pedir perdão aos deuses e ritualizar centenas de vezes cerimônias de purificação por ter me descuidado e permitido que você me beijasse.
Por favor, repita várias vezes para você mesmo até entender: "Ele não vai conhecer a minha mãe!". Quanto tempo a mais vai precisar para aceitar que não farei companhia a sua mãe? Nem o nome dela eu quero ouvir. Sentar no sofá e fingir empatia com ela enquanto eu espero você terminar de se arrumar: jamais! Odiando estar ali e na sua mente considerar que eu e ela já nos conhecemos o bastante e queremos o seu bem. Ela quer o seu bem, até o melhor se comparado ao que ela escolheu para a própria vida, mas eu? Eu abomino a sua pretensão de sentar ao meu lado no metrô e segurar a minha mão em frente às pessoas. Não percebeu que eu estou imensamente envergonhado? Olhe para dentro de si e veja se pode ser interessante para mim?
Sempre duvide de mim, muito pelo o que eu lhe ofereci e pouco pelo o que pensei e não ousei comentar.

10 janeiro, 2017

O meu rosa para o seu azul

Particularmente, penso pouco no meu presente. Imagino sempre caminhando por entre névoas humanas, infelizmente. Mas hoje foi incomum. Digo incomum porque raramente me surpreendo e hoje, como não esperei, surpreendi-me com algo humano. Não pense que deva ser humanos vivos: pelo contrário! Arrepiei-me com os mortos. Delacroix, Degas, Picasso, Di Cavalcanti, Manet e, claro, Renoir.
Os humanos vivos são sempre previsíveis, mas não os quero em meu primeiro plano, justamente por ter me reencontrado nas obras de arte mais vivas que já visitei, até agora. São telas e esculturas (uma helênica, outra romana e duas chinesas) que povoavam o meu imaginário artístico incompleto e reviveram novas ideias e impulsionaram outras reflexões. Há mais dúvidas agora e elas se apresentam a mim como aliadas, dóceis e instigantes. Quero mais, voltei a querer mais! Ter mais sede do que se pode sentir diariamente. Desejo profundamente me embalar diretamente no imaginário das artes plásticas para poder voltar a respirar. Poder saciar minha dúvida sobre quais obstáculos antropológicos foram ultrapassados e vencidos. Venci o medo? Creio que não, mas já o reconheço aqui dentro de mim. Medo que me impede de querer voar mais distante e alcançar algumas sensações de estar em frente a uma estátua helênica ou até mesmo vivenciar a contemplação de poder mensurar os centímetros de uma estátua ameríndia de uma divindade de dez mil anos. Essa felicidade, momentânea, que vivenciei ao lado de humanos vivos a contemplar a memória de humanos mortos, me reanimou a definir novos traços e experiências: uma é não se desenxabir frente à possibilidade de encontrar o passado. Sobre o futuro não quero me ater mais. Ater-me-ei ao meu presente. Vem comigo?