31 dezembro, 2014

Novo feliz ano

Há tanto o que ser dito desses últimos meses. Primeiramente, completaram seus deveres. Obrigações intermináveis, mas com fim sólido. Avassalador, diriam. Conexões incompletas. Acordar tornando o presente acumulado em um passado instantâneo.

Há tanto o que se comentar dessas últimas semanas. Justamente porque figuraram uma peça com atores vorazes. Juventudes que se tornaram imediatamente velhas. Ensinamentos ditos pela falácia, com garganta apodrecida ainda em tenra idade. Olhares despedaçados. Bocas infiéis. Suspiros, contudo, que desembocaram em verdadeiras descobertas. Revelamo-nos uns nos outros, gratuitamente.

Há tanto que se dizer desse ano. De um ano que se multiplicou 365 vezes sem paradas e equilíbrios. Uma jornada indeterminada que ao menor sinal de desavença permitiu o desafeto. Paralelamente, toques dados por amor também completaram essa jornada. Curta ou não, a verdade habitante de seres sempre conectados prevalecerá. Pode demorar mais um ano, talvez, mas sempre ocupará a história de seres.

Jornada quase interminável que surrupiou liberdades, lascou vontades, ceifou alegrias e amputou momentos mágicos.
Mas deve haver mais ditos sobre esses últimos instantes, que como todo bom observador da rotina se gratifica com a incerteza do futuro para novos saberes. Não tão perto de nós, e sim em nós mesmo, lá está nosso grande desafiador, o tempo. “Você fala muito do tempo, não é?” Eu havia escondido a verdadeira resposta: é ele quem fala sobre nós, meu amado amigo. Sempre foi no ontem que nos resta a memória, durante nosso respirar enquanto acordados vivemos e no nosso futuro indevido. Sim, totalmente, impreciso. O tempo deveria ser chamado imprecisão. Perpétuo. Impenetrável. Desafiador. 
Como se disse desse último ano é: já se sabe o que dizer. O que não sabemos é escrever nosso ano sem aquela pitada desumana de incertezas, de intensos desvios e insuportáveis aprendizados. E, por fim, entre margens de rios, água pura e firmeza entre pares encerra-se uma data para surgir um dia.

17 dezembro, 2014

Conexão São Paulo

Foi uma sensação extasiante, de repente! Pensei naquelas horas quando em São Paulo, anos atrás, ocorreu o encantador encontro. Pensei naquele ano que nos reconhecemos abaixo do MASP.
Que aroma! Era tarde, nublada, claro, mas estávamos em São Paulo. Juntos pela primeira vez. Ousaríamos? Aquele sentimento de surpresa a qualquer momento elevava-me. Carros e pessoas atrapalhavam minha espera. E daí? Eu não era deles mesmo. Era tarde e com luz adequada. Como se Deus, Iemanjá e Buda quisessem que o retrato estivesse bem em cores e sons.
Não esperava apenas uma pessoa, eu esperava você! Inexistiam despropósitos, apenas visões. Desliguei-me do tempo cronológico, já não tenho memória para saber se houve ou não atraso. E quem se importou com o horário, não é? Tanto fazia, pois problema algum aconteceria. Inconveniente algum aconteceu! Eu só desejava conversar entre prédios e constâncias humanas. Poderíamos sentar em cadeiras de madeira num bar entre a Teixeira da Silva e a Treze de Maio. Imaginei muitas situações. A principal seria como eu me apresentaria. Expressaria sorrisos juvenis!? Como eu mais amadurecido me comportaria como criança? E os olhares, como seriam? E as falas, adequadas? Deveriam ser dadas em harmonia com os movimentos do corpo, não? Ficaria aguardando o momento exato para intervir? Que momento? Que certo? Quando certos? Éramos nós mesmos, sem travas, apesar de desconexos. Isso foi culpa de conhecidos em comum acordo em antiga rede social. Como pôde acontecer? E aconteceu!
Ali estava eu encurralado e com vistas para a Praça Geremia Lunardelli. Ventava, suavemente, eu lembro. Ansioso, conforme os transeuntes se embaralhavam no percurso das calçadas, não saberia em qual das direções se apresentaria. Poderia ser pelo norte, leste ou oeste... Mesmo assim estava a respirar sem sofreguidão. Tentei decorar todos os movimentos ao meu redor para poder dar cortes adequados à memória. Como seria seu semblante lançado a tantos rostos desconhecidos? Endurecido pelo pouco contato com o movimento desenfreado dos paulistanos ou dócil como se esperava do lado no qual nasceu? Havia pretendido não criar expectativas, mas...
Poderíamos percorrer toda a extensão da Consolação sentido República. Certo estava que nossa direção era o acertado encanto. Não choveu, somente esparsas aparições solares. Dirigir até o Museu da Língua Portuguesa foi como flutuar entre folhas em pasto amplo e sem curvas. Ao adentrarmos o edifício havia mais que felicitações, havia Lispector. Como poderiam os deuses acertarem novamente a nossa temperatura? Fizeram-nos dois amantes dessa literatura. Os olhares, depois os cumprimentos iniciais, a rotina ao nosso entorno e agora a literatura que aspirávamos... intensos todos como Lispector. Naquele momento surgiu em mim o inconstante e surpreso. Planejei o ideal e ele se doou a nós voluntariamente. Incrivelmente destravei-me. Tomei-me por nós. Entramos. Faltavam poucos minutos para o encerramento e como que empurrados às celas, paramos em um orbitário lispectoriano. Era uma constelação de estrelas que se misturava com um enredo de dizeres de Lispector. Não nos cansamos de, entreolhares, dizer à literatura a nossa vontade: universos, o meu e o seu, vivificamos para o sempre a completude sem egoísmo. Saímos quase correndo do prédio e nos deparamos, novamente, com a rotina, ainda empedrada e sem gosto. Ah! A quem interessava senão a nós mesmo nos embalarmos até o bar. E já acomodados em poltronas do bar da Associação dos Amigos do Museu de Arte Moderna de São Paulo deliciaríamo-nos em dizeres autorais. Sem vergonha e pudores, mas nobres em orações. Havia ritmo, não? Houve conexão, não? O movimento lá do outro lado das janelas não nos valia mais. Invalidava a ansiedade. O que nos separava até aquele momento eram as Federações e agora estávamos lá! Sentados a espera de nós mesmo, unicamente.
Como Cronos é um deus invejoso! O tempo passou rapidamente e desde o momento de nosso encontro até aquela empática duração sufocamo-nos em sorrisos. Verdades ditas banhadas à sinceridade enquanto acomodados em poltronas, ouvi em meu direito ouvido uma provocação. Cegou-me e “voilá”! Já sabíamos a medida. Foi dado o comprimento de nossa façanha. Descobri pela primeira vez que o encanto não é gratuito e quando ele nos aborda é difícil derrotá-lo. Por essa razão escrevo! Para que o universo possa quando nos ler restaurar em mente a originalidade do encanto, invejável a qualquer escritor de contos. Foi dele, o universo, a conta que nós quitamos. Desenxabido, degustou os melhores sabores, aprovou as mais intensas palavras e respirou o desejo de modo irreparável. Danado universo aproveitou-se da comunhão.
Repete para mim a provocação até hoje. Extasio-me, porém não me paraliso. Apenas guardo o deleitável retrato que se emoldurou em ardor no peito.

14 dezembro, 2014

Dois por um só

Pequenos contos para pequenas emoções e histórias.

Havia dois meninos que se sentaram juntos e juntos comentaram situações de uma vida completamente eterna. Desconhecidos, após os esforços em um parque de diversão que de início não lhes rendeu sorrisos, inventaram-se. Juntos, ali entre os fios de um meio caminho, naquele instante de intervalos, estavam dispostos, lúgubres e intensos como toda criança deveria ser a procura de um conforto. Falaram de coisas do cotidiano. Simpáticos, pareciam vizinhos de longa data. Eram gostos e linguagem próximos. Completavam frases com provocações e riam após entendimento. Paravam entre olhares e mais ironias, típicas da jovialidade. Trocaram envolvimentos ingênuos, sempre puros, contudo. Riam, riam e cada vez que um ria do outro o próximo se esplendorava. Era comunhão e ninguém ali poderia impedi-los. Ao menos para um deles... Desafiavam o cansaço. Foram minutos após minutos de exercícios. Tocavam-se. Apertavam as mãos. Estavam a sós. Mas, como nada que seja puro permanece intacto nesse universo: desconheceram-se, repentinamente. Pelo que? Um afirmou, despretensiosamente, logo após se redescobrir quase como um movimento dialético, ser pela devoção à injustiça originada pelo companheiro: já haviam desgastado todo o tempo da pureza e descoberta. Acabou o mistério! Uma lástima... O outro, pela competição, sem mesmo investigar, exclamou não confiar mais naquelas declarações. Eram para ele enganosas. Supostamente. Lá estavam novamente sós. Estranharam-se. Conforme as mães reivindicavam suas presenças, os dois se distanciavam mais e mais, de modo que se tornaram desconexos. O que era brio compartilhado transformou-se em birra. A mais desvelada sensação de conforto tornou-se antipatia e etiqueta. E, por fim, o que restou entre eles era unicamente a devoção vivenciada em amor espontâneo e futuramente omissa. Inexistia a possibilidade de negarem a si mesmos. Já havia conexões. O parque fechou, as mães os tomaram pelos antebraços e cada um voltou a sua roda da fortuna.

08 dezembro, 2014

Espelhos

O popular conduz de modo exemplar as sabedorias: quebrar o laço é o primeiro passo para o infortúnio. Ali, quase como uma criança que desastrosamente desconhece a firmeza do próprio punho, inocentemente foi vencido pela gravidade. Era um banho qualquer e por qualquer desatenção o despropósito aconteceu. São afetos desfeitos por simples quebra de decoro, isso quando há para arder em descarte.
Desfazer interesses agrada mais à vaidade que favorece os justos esforços. Agora, quebrá-los, ai sim acometem-se ao infortúnio. Já estava quase tudo preparado para o início de frutuoso devir, mas... o descuido, o falso interesse e a mesquinhez levaram-no a quebrar. Ao menos fosse desfazê-los para futuramente resgatar aromas, sorrisos e vigor.
A cá! Conduzimo-nos pelo caminho de uma vereda irônica. Caminhar sempre foi desgostoso esforço, mesmo ainda mais moço, apesar de conhecer as existências, cônscio de sua solidão.
Era apenas para se ensaboar. O enxágue seria fatal. Por que se ocupar de duas coisas ao mesmo tempo: a si e a própria insegurança? Naquela madrugada não foi isso que pode acontecer, porém. Um natural banho se tornaria sentença para outros 7 ou 14 anos de infortúnios. Quem saberia contar agora?
Caberá ao próprio popular reinventar a roda da fortuna de quem desfez laços, acomodou-se em lençóis em noites apartadas de pele e quebrou a particular fortuna. Ah, ah a vaidade! Tão formosa entre nós.

03 dezembro, 2014

Não há comédia nos séculos pós-aleguierianos

Já não deveria mais ser acompanhado por Virgílio, mas conduzido por Beatriz.
Já não poderia vivenciar as turbulências e as amarras oferecidas por Virgílio.
Deve-se selar a clausura de um dado finito, pois inexiste fôlego entre os fiéis.

01 dezembro, 2014

A terra



Raro ouvir uma declaração sobre a terra, talvez o poeta que “nasceu pra passarinho” seja o único representante literário de defesas como essa. Mas por que pensar que a terra seja o elemento inútil? Eu vou procurar decifrar essa matéria, pretensiosamente.

Os primeiros interlocutores me disseram que a terra é desimportante porque está abaixo de nosso horizonte visual. Como não se fez o humano os olhos no pé, então é mais certo crer que não há importância o baixo.

Depois, o segundo grupo tentou me convencer de que a terra é suja e por essa razão não haveria necessidade de apreciá-la. Relutei em querer desaprovar o argumento, mas ele existe.

Percorrendo outras mentalidades, o terceiro grupo pretendeu me surpreender afirmando que a terra é maleável e sem forma definida. Com o passar dos anos as dunas, por exemplo, não permanecem na mesma dimensão. E constantemente se estendem voluptuosamente pelas regiões distantes nos braços do vento hiperativo.

Inconformado em encontrar apenas um, mas letal defensor do elemento terra, ainda me encontrei a memorizar a quarta inconformada opinião: a terra nos é inútil por causa de um aroma que não remete a ninguém e ao nada. Não é possível classificá-la pelo simples entender: quem ao rolar na terra, mesmo por diversão, após se levantar não procura imediatamente a limpeza. Quem se importaria a permanecer exalando o inexistente aroma de terra? Por que se é possível quase imediatamente limpar as partes do organismo e ficar cheiroso após uma ducha bem ofertada?

Mesmo desanimado continuei advogando uma paciência para receber delicadas palavras que pudessem acalmar minha angústia pela defesa da terra. E quanto menos esperava havia me deparado, novamente, com mais uma desonrosa situação contra a terra. O quinto grupo declarou com sorrisos na face de que a terra é muda. Conforme vão se movendo os seres superiores, ela, a terra, não expressa sons. Palidez sonora seria uma benção. Não, ela é fatidicamente muda e sem mais.

Gozado, pareciam sentenças dotadas da mais pura verificação científica. Comprovações inquestionáveis. Decisões unânimes.

Não satisfeito decidi me importar com o mais nobre dos seres superficiais, o humano, e por bem-aventurança descobri que é a terra, mesmo sem ser alvo dos olhos, que sobre ela as pessoas se encontram; que por mais insosso seja seu sabor é sobre ela que as pessoas demoram horas apreciando beijos com apimentadas mordidinhas; que além de ser volúvel é sobre ela que as casas rígidas são construídas e podem abrigar os mais afetuosos e sinceros abraços apertados; que por mais desorvalhada seja sua fragrância em mais ínfima espessura, é nela que o puro verde das plantações aplana os fogosos amantes e, por fim, se por menor parcela de sentido seus ruídos não embalam ritmos, é somente por ela que se contam os passos dados a dois em um frenesi de movimentos inconstantes.