14 janeiro, 2017

Por que?

Sempre duvide de mim. Duvide do quanto eu possa lhe dar. Possa pretender oferecer. O que eu ofereço é artificial, momentâneo e despretensioso. Sempre desconfie do meu sorriso. Ele é rígido e seguro, mas indevido: é apenas cenográfico. Desconstrua as certezas sobre mim e muito menos acredite que esteja havendo um "nós".
Retire de sua memória as palavras dóceis que lhe ofertei quando nos apresentamos. Oferta de menos é o maior lucro conquistado. Quando toquei seu braço foi por descuido e não para insinuar desejo, porque eu não o sinto ainda. Não fico imaginando estar ao seu lado quando acordar e convidar para o cinema num sábado à noite. Minhas intenções são nulas. Eu estou nulo. Talvez eu o seja para sempre. Já não consigo mais pertencer à alma alguma. Elas são sem nutrientes para mim. Você é sem nutriente para mim. Não tem fibra, força. Jamais me estimularia. Absolutamente, desnutrição.
Por todos os santos e santas, destrua esse sentimento que ousou possuir, pretensiosamente. Você não tem sustentáculos emocionais para me pedir que fique. Seu lado é o menor espaço que eu poderia residir. Ele é claustrofóbico, deprimente, inseguro, imaturo, desenxabido, desagradável, desinteressante, impróprio, envergado, dissimulado, vil, torto, impuro, infiel, inacabado, úmido e, fundamentalmente, não meu.
Sempre duvide de mim. Procure manter distância. Seu odor altera meu humor. Fico irritado com a possibilidade de poder encostar meu nariz na sua bochecha ao cumprimento polido e exponencialmente desnecessário. Envolver minha mão por volta de sua cintura e sussurrar ao seu ouvido? Por favor! Precisaria pedir perdão aos deuses e ritualizar centenas de vezes cerimônias de purificação por ter me descuidado e permitido que você me beijasse.
Por favor, repita várias vezes para você mesmo até entender: "Ele não vai conhecer a minha mãe!". Quanto tempo a mais vai precisar para aceitar que não farei companhia a sua mãe? Nem o nome dela eu quero ouvir. Sentar no sofá e fingir empatia com ela enquanto eu espero você terminar de se arrumar: jamais! Odiando estar ali e na sua mente considerar que eu e ela já nos conhecemos o bastante e queremos o seu bem. Ela quer o seu bem, até o melhor se comparado ao que ela escolheu para a própria vida, mas eu? Eu abomino a sua pretensão de sentar ao meu lado no metrô e segurar a minha mão em frente às pessoas. Não percebeu que eu estou imensamente envergonhado? Olhe para dentro de si e veja se pode ser interessante para mim?
Sempre duvide de mim, muito pelo o que eu lhe ofereci e pouco pelo o que pensei e não ousei comentar.

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