Risos. É somente isso que nos
causamos. Nada de implicâncias, mas as mais dóceis provocações. Risos e mais
risos. Pareciam infinitos ao seu lado. Eu deitado em seu colo e quando ausente sua atenção: mordendo suas
bochechas. Risos quase intermináveis. Risos com sabor de melancia para mim. Risos
e hiperisos. Mais e mais risos. Anteontem lembrei-me de como suas mãos insistiam
em me fazer cócegas... Panaca! Risos. Sofro de outro mal: o de provocar risos. É
quase improvável que vá me torturar a fim de ter o mesmo que eu faço com seu
corpo sobre o meu. Risos e outros mais risos. Leves toques e quentes intenções entre
nossos corpos. Ora eu por cima de seu corpo, ora você reclamando da nossa
brincadeira. Pulo sobre seu corpo já deitado na cama. Risos e quase
gargalhadas. Lá está esperando o morno e eu sempre oferecendo o fervente. Pulo
em cima de você e temos o que? Claro, insuperáveis risos. Você tenta se
esquivar, mas sabemos que está adorando. É como um pueril ser que se enxerga
novamente na infância. A minha alegria nunca foi pertencer a você, mesmo de
alma. Minha alegria era ter seu rosto risonho gravado em minha mente. Ah! Risos
ingênuos. Que frescor era encontrar-me convosco em sonho ouvindo um elogio,
recebendo suas mãos em minhas pernas e seus lábios em minha carne. Suor e
risos. Nada mais era importante. Nem o ar que você me fazia, desesperadamente,
esquecer. Quantas vezes me sufocou de alegria? Para mim, sim, a alegria é o maior
sufocamente de risos até doer e doer mais a barriga. Dor. Dores. Lá estávamos
em nossa cumplicidade de risos. E depois para parar o encontro de risos:
bocas tocantes e mornas com línguas entrelaçadas. Lá estive em plena alegria e
como tudo que é mais puro e incrível para mim, acabou. Risos desenxabidos. Resta-me, hoje, uma leve lembrança de seu rosto. Onde estariam meus risos sabor pão-de-mel agora? Por
Deus...
Sou humano, sou real e sou vivo. A matéria não me domina, apenas me suporta. Minha essência forma-se a todo momento, assim como um despertar confuso e inseguro. Meu inconsciente realiza-se a favor de outrem. Minha animalidade revela-se quando estou só. A solidão confidencia-me poucas mentiras. Sabes quem eu sou? "Eu sou o que sou!" (O Criador)
26 fevereiro, 2016
25 fevereiro, 2016
O sonho
Acordei
um pouco entristecido. Na verdade, incrivelmente entristecido. Cogitei em não laborar. Mal vi a claridade da manhã. Silêncio lá fora. E ali, ainda deitado, permanecia com muita vontade. Contarei o motivo pelo meu desânimo.
Estávamos numa festa e seus olhares pareciam ser só meus. Seu corpo já está ocupado com outro corpo, eu sei, mas não cometeremos traição. Seus olhares com os meus sempre foram cúmplices, lembra? Entretanto, o receio me impedia uma aproximação. Os festeiros, empolgados, subtraiam-se de nossas vistas. Éramos apenas eu e você e seu outro corpo, enciumado, porém. O que eu mais desejava era um cumprimento como bons parceiros, pois sei que não há amizade entre amantes doadores. Mas você nunca provocou isso, não é!?
Em
outra cena diferente, para minha total surpresa, conversávamos dentro de um
ônibus que iria para um destino desconhecido. Eu ali, extasiado e completamente
perplexo, conversava como se nosso ontem fosse uma rotina e aquele hoje
consagrasse o meu desejo com a sua permissão. Foi tudo muito rápido e intenso –
ao menos para mim. Você ria. Sua boca parecia querer se depositar sobre meus
lábios, já mornos. Seus olhos quando não fitavam os meus estavam em minha boca.
Elogiou meu sorriso e o perfume de minha roupa. Em instantes, movimentou o
corpo como se fosse sair. E, subitamente, beijou minha bochecha esquerda. Tentei
resmungar algo, mas nenhuma conjugação saiu. Sentia que sua parada já estava
próxima e quando me confirmou que desceria eu questionei: “Para onde vai?”, acompanhado com o pensamento da maior esperança do cosmo de que me entoaria um convite para lhe acompanhar. E
ainda com o sorriso nos lábios respondeu: “Para casa.” Pensei em me despedir,
mas já havia descido. Não se despediu como a etiqueta pede, não era seu forte
ser gentil comigo. Creio que foi em minha impressão a real certeza de que
gostou de estar, mesmo rapidamente, ao meu lado. Impressão... Seu beijo, macio
como sempre, foi o elemento principal que não me fez querer despertar. Talvez uma
terceira cena onírica juntos? E quem sabe conquistaria a mim mesmo para tentar
um roubo: seu beijo em meus lábios saudosos.
Abri
os olhos com a maior dificuldade. Levantei-me e após um banho sai. Entrei no carro, liguei o rádio e a música daquela sua cantora predileta
tocava. Depois de ficar verdadeiramente desperto tive consciência de que você
não vela mais por mim. Laborei, mesmo desenxabido. Ao retornar à casa,
sentei-me no sofá-divã. Olhei o teto e repousei o olhar na poltrona que você se
sentou, umas duas vezes, com meu pijama de inverno. Inspirei o ar pesado na sala quase rubra. Preparei o almoço. Sentei-me só. A mesa cheia de temperos e condimentos. A leve brisa que corria pela porta aberta. O cheiro do alimento não me motivava a dar a primeira garfada. E notei que algo ficou claro em minha mente: lá estava você. Ao som de Onde estará o meu amor?, interpretado por
Maria Bethânia, contive-me.
17 fevereiro, 2016
Bata
Bata como se sua força não fosse finita
Estrangule a mais degradante parte minha
A mesma que dilacera por séculos a humanidade: orgulho
Bata, bata sem comiseração
Pois o canto que me ofereceu não é mais sutil que seu braço
distante dos meus ombros
Menos doloroso que sua mão em minha orelha
Mais árduo que o osso que se quebra na mandíbula
Bata
Bata quantas vezes quiser
Bata com esse sorriso que esfrega em minha memória
Essas mãos sólidas e sem calos que penetra em minha carne
maxilar
Ainda quero que bata na minha boca
Mas, por favor, não se esqueça de todo o resto, já inválido
Bata
Bata com tanta vontade que me faça chorar
Chorar por ter sido pouco ou mesmo desimportante
Fui ser o mais desagradável possível em sua vida
Bata
Bata com a indiferença
A mais ardida das dores que você poderá me tocar
Não me olhe nos olhos quando desferir o golpe
Não ouça meus reclames
Ignore o pedido de perdão
A clemência não deverá atingir seus ouvidos
Quanto mais seu coração
Não traga mais, compartilhando, o mesmo cigarro
Bata
Bata como se eu fosse o mesmo que o seu traidor preferido
Aquele que o feriu sem pudor, repetidamente
O mesmo desumano cínico que permitiu
Que o seu corpo repousasse em outra cama, ferido
Bata
Mas por favor bata para haver morte, de vez
Pois não há no mundo todo um só alento
Que me faça esquecer definitivamente
O brilho nos meus olhos que só você permitiu criar
ao se aproximar
Eu repetirei o clamor até você se impor
Bata!
Bata!
Bata para que meu coração deixe de estar partido
Que átrios aguentariam tão forte pulso de sangue de uma
única vez?
Por favor!
Somente bata
Bata de uma vez, desgraça!
Bata por todas às vezes que sentou em meu sofá a minha
espera
Enquanto em banho me dedicava a outro riso
A outra espera
Bata por saber que eu fiz o mais rápido tempo em trajeto
apenas para não o deixar sozinho por mais instantes ociosos
Bata porque eu amei
Pelos deuses, estúpido! Bata!
Como eu queria estar lançado à sorte, novamente
Ao menos teria ar em meus pulmões
Ares que não usei enquanto você não queria mais um trago
Bata!
Por Deus me bata, vil!
Bata com a mesma força de quando foi surrupiado
Para que não carregue mais, por fim, essa mágoa
Já não estamos mais nos mesmos lugares
para sempre?
Bata!
Mas bata dentro de mim!
Não bata no mundo
Nunca no mundo
Porque ele revidará
Em sua simetria não poderá haver marcas
Já há aqui um peito cicatrizado sem vontades de continuar
Ó, por tudo que é mais nobre nesse universo consumista!
Por todas as partículas que nos compõe
e virtuosas ações de nossas mães
Bata!
Bata!
Apenas bata, sem cansaço
Procure bater com o ritmo do relógio
para não descompassar
Bata!
Quero estar em leito de morte e sentindo a dor que é o toque
de seu desafeto
Que horror eu causei para receber em vida tamanha
provação?
Bata, por Deus, apenas para me livrar desse fragmentado que arranha minha mente
Bata em minha cabeça para que ela se dilacere!
Não admito mais ser esse monstro ao ver sua imagem em
retrato e não me constranger
Bata
Bata com o tamanho da minha saudade
Cânion entre peles alvas
Rostos decentes e pueris
E bocas marcadas por falsas sabedorias
Eu quero a morte!
Sem poder ouvir a sua voz
Talvez a ínfima das partes que me resta
Já não existe mais com alegria
Que todos saibam
Que morri infeliz
Descontente
Desgraçado
Bata, ser vil!
Ao menos bata
para não ser mais um "saco de batatas"
Para o meu propósito final
Pois já não nos temos mais
na segunda pessoa do singular.
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