Você bem que viveu intensamente ao
meu lado por alguns anos. Pensei várias vezes que o meu gostar não seria finito. Bobagens que
se fixam na mente de pessoas de minha idade. Sua pele branca, voz altiva e
detalhes que apenas o bom observador, como eu, poderiam notar, sacudiram meu
coração. Eu, mesmo seguro despreocupei-me quando estava em sua presença. Foram horas
um ao lado do outro. Como irmãos de sangue, grau que sempre reivindiquei,
pensava a cada momento que meu gostar fosse cristalizar e engrandecer. Também pudera,
nós humanos somos sempre trapaceados por nossas ideologias e sentimentos
infantis. Os meus sempre foram muito claros para você e agora caros a mim. Verdadeiramente,
não escondi qualquer nuance sobre minhas vergonhas. Mal eu pude reparar que
elas apenas o feriam. Eu declarei aos cantos dessa cidade mesquinha que o seu
nome era mais que um gostar, era amor. Havia em nós dedicação, companheirismo e
uma sutil alegria. Qualquer casal amoroso nos invejaria. Qualquer casal
fraternal reclamaria. Os meus sonhos, os maiores, foram todos compartilhados
com você. As minhas falhas e queixumes. Doei-me. E agora? Não tenho mais a sua
companhia. Não sei se tenho mais o mesmo amor. Tenho a mim mesmo, como sempre
tive. Dores divididas são sempre eternas. Isso você descobrirá. A qualquer
momento podemos nos tropeçar. Devo cair ou negar nosso passado? Se eu não mais
o vir, caberá a mim o título de Pedro, aquele chamado também de “o traidor”? O tempo
faz graças e malefícios. Como não o controlamos, apenas vivemos suas decisões,
eu cá, mesmo adoecido, e você, ai, sabe-se como, seremos atingidos pela aguda e
avassaladora flecha do desconhecido, antes da morte. A cada momento sinto
esvair de minha mente o seu sorriso deslumbrante. E a certeza de que eu não me
aproximei da cela que havia preparado para mim. Mãos em meus ombros? Jamais ousou
se aproximar de um corpo com tamanha felicitação. Cabeça em meu colo para um
cafuné inesperado? Ainda bem que eu soube teatralizar. No fundo eu já sabia de
tudo. Confesso: era uma nova relação, porém. Talvez não para você. Há anos
venho refletindo sobre minhas limitações e me esquecendo das astutas habilidades.
Resisti e não cedi aos possíveis encantos oriundos de sua natureza direcionados
a mim. Talvez estivesse ai a sentença de nossa finitude. Claro, eu mesmo me
esquecendo de verificar minhas lembranças, dei atenção àquela “voz” intuitiva
que sempre me salvou. Parece que devo a mim mesmo o fabuloso modo de me
distanciar dos humanos, pois deles só encontrei o dissabor ou estou eu tomado
pelo desterro arfante da desesperança. Tenho em meu mural de fotos sua imagem e
a cada dia, desde nosso distanciamento, relembro cada “eu te amo” que proferiu
a mim, para que jamais eu volte a acolher novamente alguém em zelo. Ao som De tanto amor, de Roberto Carlos,
encerro.
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