Fomos (re)criados para
pertencermos a tantas coisas. Uma delas é a nossa fantasia, a mais brutal
capacidade da invenção mental. Outra é a pessoa humana. Não seriam coisas
propriamente, mas situações que nos impedem de verificar nossa universal e
precisa vontade de sermos um conjunto e propomos, erroneamente,
de nos tornarmos seres únicos. Entretanto, estamos ali por nós mesmos,
diariamente, com inquietações, ressentimentos, fluidos de alegria e esparsos volumes
de solidão. Pensáveis momentos agradáveis em companhias honradas, por um lado,
e instantes tão supérfluos ao lado de desconhecidos: tornados paródia da vida
contemporânea. Ironicamente, aqueles rapidamente encerrados pelo cronômetro
enquanto estes parecem perdurar milênios.
O que sempre conquistamos,
mesmo para o bel prazer, pela satisfação de sermos notados por alguém
declaradamente próximo é a incerteza de nos pertencermos e pertencermos a ele,
simultaneamente. Duvidamos e essa é a mais catastrófica das sensações, após o
luto. O receio habitante em nossas entranhas nos eleva a seres ou essências quase
sem humanidade, imediatamente. “Não queremos mais sofrer!” sentenciamos, pois, para
alguns que nos brindam com suas crenças já fomos ofertados às entidades extra-humanas ou ao universo que gira e por isso não há mais razões em lutar pelo desejável. Pertencimento, todavia, não é uma escolha tão saborosa
e pasmemo-nos: nunca será, porque as decisões nos desenergizam de maneira quase
absoluta. Há aqueles considerados
heróis que nunca desistirão de singulares conquistas, porém.
Atribuímos qualidades
desconexas para a natureza humana e sequer pesquisamos o outro profundamente. Não
temos tempo. Fica sempre para depois ou para nunca mais. Desfazemos farta
paciência para despender com o passado, afinal existem tantos futuros férteis
no mundo terreno... Já nos distanciamos de nossos propósitos, desse modo, e fugazmente
almejamos a felicidade duradoura, o inatingível idealizado, o insólito constante
e o comum disforme. Formulamos desenhos mentais sobre pessoas, esboços sentimentais para
predestinados e cálculos de intenções para desenxabidos seres, haja vista que no
horizonte da dignidade paira o querer. Sorrimos disfarçadamente mais para dentro porque ao nosso
redor substituímos as verdades passadas. Quase verdades, exclamaríamos. Tentamos e
já que não se sustentou deve ser descartado, afinal, às entidades extra-humanas
ou ao próprio movimento do universo cabe o dia em que iremos viver uma grande
experiência vital. Aguardamos atentamente por demonstrações irreais de
fidelidade de pessoas caracterizadas por nossas pretensões e pouco por
desavergonhadas ações virtuosas. A atitude já expressou o gosto pelo conhecido,
sabido, esperado e seguro.
Valemo-nos de
competições e apimentadas conversas acirradas para demonstrarmos a
superioridade de consciência, raramente encontrada nas saudáveis relações
humanas. O elemento motivador do virtuoso é a associação entre o tempo e os
saberes. Julguemo-nos por nossas imperfeições e esqueçamos as maravilhas
conquistadas pela empatia, originada em um descanso durante a jornada do
cotidiano. Teatralizamos estupidamente a dignidade o tempo todo: a alheia, frequentemente,
por medo. Suplicamos desejos que jamais se revelarão, por empáfia. Pretendemos
vontades eternamente idealizadas, ainda que as neguemos, desafortunadamente.
Seria a dignidade alheia tão vorazmente mastigável que não é possível admirá-la
enquanto dura vida, mesmo sabendo, que pelo resto de nossa existência
inexistirá o retorno após o seu desterro? Com o gasto do tempo em vida já
anulamos quase que automaticamente as possibilidades. Quando frágeis em dado momento seremos condenados por todo o infinito. Adotemos o ideal do super homem nietzschiano ao passo do
mais vagaroso animal terrestre ou ainda nos apoiaremos na clássica fórmula
política em que apenas os deuses e os monstros vivem sozinhos? Ao som de
Frédéric Chopin, prelúdio em E-Menor, ópera 28, número 4, encerramos, cônscios
de nossas decisões.
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