Antes do final do mês ele já previu a desonra. Por décadas ouvia dizer que a morte era certeira, mas que durante o decurso da vida poderia provar o seu valor. Com o mesmo passar do tempo, percebeu que o único valor importante era o material.
De dia pensava como conseguiria levantar da cama para poder produzir. Em nada, em nada poderia acrescer. Dizia que pelas manhãs não se pode trabalhar muito e por isso declarava que apenas queria estudar. Estudar era prazer. Trabalhar sempre foi obrigação.
De tarde era o escárnio. Tudo demorava e derretia. As pessoas eram mais incômodas. Chateadas. Intermediárias. Ele queria existir pouco durante as horas vespertinas, assim como a maioria das pessoas. Já em casa, o vento soprava em miúdos. As ideias não vinham e a pouca vontade se estabelecia. Não existia poesia, era apenas escárnio! Nem televisão conseguia ligar.
Por todos os olhares de sua vida, só restava para ele as noites. Eram nelas que a exaltação acontecia. O êxtase se manifestava e o desejo se alinhava ao corpo. Depois, tentava o descanso, em vão. Escovava os dentes antes de beber o último gole d'água. Vestia o uniforme de dormir. Lançava os pés para fora da cama e pressionava o próprio corpo contra o colchão. Por fim, se refestelava em imagens oníricas sensuais, adormecendo.