Sabe o que é deprimente? É estar aqui em frente ao
computador olhando suas fotos. Fotos que antes eu admiraria gratuitamente. Sem
pressa. Por minutos. Comecei fitando seus olhares e reparei que eles se
apresentam tão mórbidos agora, como nunca antes eu havia visto. Ao som da
música de Mercedes Sosa, Todo Cambia,
e o pensamento focado em sua imagem, nada além de sorrisos e olhares mórbidos
consigo enxergar. Por quê?
As pessoas possuem ainda muita esperança em suas ações.
Ações várias vezes descoordenadas e, talvez, não planejadas. Mas eu? Justamente
comigo? O que foi que eu fiz então pouco tempo ao seu lado? Como queria me atingir
e acabou arruinando tudo o que eu sentia por você? Como um prédio em demolição,
eu não consigo mais amar você. Eu não posso mais amar você!
Quantas vezes eu pensei, por dias e semanas, quão bons
seriam os momentos ao seu lado, como amigo. Sinceramente, amizades hoje em dia
não são comuns. Era para estarmos conversando sobre a vida e não contemplando
algo um do outro, como se fosse artimanha para inflar egos. Antes, muito antes
de não nos falarmos no Parque eu me culpava. Sentia pouca coragem em querer
entender aquele sentimento que me atingiu e rapidamente me endoidou. Fiquei
confuso, claro. As relações humanas estão sempre em movimento. Eu me permito
estar sempre em movimento. Mas você? O que fez, fugiu! Fugiu como uma pessoa
insegura. Eu entendi, mas... faz anos e eu tive que refazer. Até quando apenas
uma margem do rio é assaltada sem se desfazer? Entretanto, quando menos eu
imaginei estar vulnerável, você e o seu movimento já estavam em minha órbita.
Eu não estava na órbita certa ou até mesmo no modo de pensar sobre minha órbita,
que muito me caracteriza: pretender ser justo. Tudo bem, a vida tem mais baixos
que altos. Mas eu? Novamente a história se repete? Por quê?
Fiquei impressionado com seu crescimento, ao menos em foto
me pareceu inatingível. Como poderia tão jovial ser sempre estar disposto,
sozinho ou ao lado de pessoas a mim tão desconhecidas, sorrindo perfeitamente? Ah, sim! Eu tenho que confessar para que haja o mínimo de interesse: o seu
sorriso foi o mais belo que eu já vi. O que isso importa agora, não é? Ser
alguém sincero em dias como os atuais não significa nada, absolutamente nada. E
depois? Veio a viagem e não nos encontramos mais, como amigos, como sinceros
amigos. Você acha que eu estaria apaixonado por um belo presente sem ter
percebido o seu conteúdo?
Pois é, sim, você me surpreendeu, admito, novamente. Eu não
entendi muita coisa na hora. Estávamos inebriados e você falava soluçando. Eu
tentei recordar do passado que me foi muito caro manter até hoje, justamente
porque amigos guardam e não desistem um do outro. Você desistiu de mim uma vez.
Essa é a segunda e, para mim, a última vez. Você me entendeu? É a última vez
que você desiste de mim. Como ouso a ser o centro? Não se trata de mim agora. É
sobre você. Quer mesmo entender? Claro que você não quer entender, nem
respondeu minha mensagem. Sou objetivo em algumas procuras e mensagens e dessa
vez fiz sem muita emoção porque me parece que nesse mundo a água do vaso de nossas flores secou e a planta parece murchar ininterruptamente.
Não estou aqui para falar apenas de nós. Na verdade esse
deve ser o centésimo texto que eu escrevo e depois excluo. Eu sempre preparo
uma fala poética sobre você e o quanto, na verdade, eu odeio você. Creio que
hoje consegui, apesar de pouquíssimas palavras. O sentimento ainda é pulsante. Não
sairia por ai, contudo, para atingir sua integridade moral. Sabe de uma coisa,
eu respeito a integridade moral dos meus amigos. E você? Aprendeu o que comigo?
A ser um perpétuo egoísta? Foi isso que você aprendeu comigo? Não e vou dizer
mais: odeio saber que estou na sua história de vida e você aprendeu errado. Como
eu queria ser meu próprio juiz e sentenciar irrevogavelmente sua saída da minha
mente e com ela todo o carinho que por esses anos devotei a você. Devoção, sabe
o que significa? Vou cuspir a todo momento em que eu me lembrar de sua face.
Tenho horror a pensar que, justamente você, rompeu mais uma vez a linha e ousou
me enfeitiçar com sua presunção, egoísmo e fraqueza. Desejo profundamente
conseguir retirar todas as palavras que proferi a você, mesmo quando eu era um
profissional. Suma da minha vista! Eu gritaria por minutos em frente ao seu
patético sorriso. Faria questão de vê-lo mais uma vez, apenas para essa ação. Como
eu queria ter forças para realizar essa fala.
Você foi o motivo pelo qual eu me enganei, novamente, pois,
erroneamente, fiz de você um marco importante em minha existência. Tratei de
viver em meu trabalho diferentemente do que pensava. Um homem antes e outro
depois de você. Pude perceber que eu não deveria ter me ofertado a essa bela
imagem que eu criei sobre você. Porque não merece sequer que eu pronuncie o seu
nome. Tenho raiva a cada instante que se passa e você, sem hombridade e
honestidade, as mesmas que eu desde que lhe conheci ofertei, não respeita a
minha dignidade e se disfarça na cretina face do silêncio. Por que não me
respondeu? É tão superior que ultrapassou os limites do autoconvencimento? Suas
palavras são verdadeiramente falsas a ponto de não saber mais se esconder atrás
dela, depois que me revelou quem realmente você pretendia ser? O mundo um dia
saberá quem você é e eu estarei em minha poltrona, bebendo meu scotch caro
assistindo sua ruína. Eu ainda terei tempo para perceber o mal que eu deveria
ter desfeito anos atrás.
Eu não mereço conviver com essa lembrança que agora se
tornou oca, desforme e imperiosamente desenxabida sobre você. Eu não sou digno
de me refestelar nos braços da dúvida para tentar entender porque me abandonou
e me doa a distância de suas imperiais palavras. Sádico! Corroo-me por dentro e
o que você expressa: nada. É isso que terá de mim e você sabe que não consegue
conquistar além de paisagens artificiais de pessoas boas, pois você é oco. Quem
é oco assassina o próprio bem em nome da vaidade, não se despede como verdadeiro
homem e covardemente se esconde atrás o ego inflado.
Acontece que o mal é uma escolha infrutífera, mas
definitiva. Antes que eu consuma o homicídio de sua imagem em minha mente, terá
até a data de um mês após o início do solstício de inverno, do ano que vem,
para me olhar nos olhos e me relatar o que aconteceu. Quero suas últimas
palavras honestas, se assim puder, depois de declarar-me seu exemplo. A
sentença está escrita em cima da minha mesa. A assinatura dependerá de sua
atitude futura. O tempo nunca esteve ao nosso favor. Talvez seja esta a minha
última lição que poderei lhe ensinar.
Como nós dois saberemos: será a hora de nos enterrarmos,
definitivamente?